Predizer o futuro é um desafio no qual a humanidade tem se empenhado desde os tempos mais remotos. Dos livros de história, das páginas da Bíblia e de outros tantos escritos, aprendemos como a busca para se conhecer o futuro tem impactado o rumo das sociedades em suas respectivas épocas e ainda nos influencia atualmente. E esse parece ser um exercício no qual gostamos particularmente de participar quando abordam tecnologias que influenciarão a Saúde Digital.

Tenho visto uma crescente quantidade de artigos e matérias no LinkedIn, em sites da internet, em relatórios de empresas de consultoria famosas e mesmo de “gurus” de mercado abordando as tais “principais tendências” (ou TOP TRENDS) que se destacarão. E para cada título desses textos aparece um número “mágico”, quase como ao gosto do freguês, de itens que devemos prestar atenção.

Quer uma lista mais curta, veja aquelas nos artigos tipo “TOP 5”; gosta de listas mais detalhadas, então leia os tais “17 Principal Trends”, e por aí vai! São tantos números, tantas análises, que acabamos nos perguntando: alguém consegue mesmo acompanhar as tendências realmente relevantes que irão, de fato, impactar o futuro da Saúde Digital?

Há, porém, um detalhe que passei a me dar conta mais recentemente nos títulos desses textos. Em quase todos os tais artigos sobre o futuro tecnológico da Saúde, a palavra Tendência (“Trend”) aparece, já percebeu? E o que realmente uma tendência indica?

Alguns dicionários caracterizam tendência como “aquilo que leva alguém a seguir um determinado caminho ou a agir de certa forma; predisposição, propensão. Disposição natural; inclinação, vocação”. O termo também permite fazer referência à “força que imprime determinado movimento ou orientação”.

Sendo assim, a grande maioria dos artigos sobre as tendências futuras na Saúde Digital simplesmente indicam orientações ou inclinações que o mercado e a tecnologia estão sinalizando, algumas delas muito atraentes e promissoras como a Inteligência Artificial, a Internet das Coisas (IoT), os wearablesRealidade Virtual, a Telemedicinadentre outros. Mas algumas destas tendências podem estar completamente equivocadas no modo, quando e em qual escala tais tecnologias impactarão a Saúde Digital!

Veja um exemplo recente dessa tal tendência tecnológica que fracassou, apesar das enormes promessas iniciais. Chama-se tecnologia estereoscópica, ou no popular, tecnologia 3D! Talvez você ache que ela é super moderna, com no máximos uns 20 anos, não? Quem sabe já a tenha até experimentando nos cinemas, comprado uma TV 3D para ver os jogos da Copa do Mundo ou para jogar aqueles games novos hiper realistas. Mas ficará surpreso de saber que a tecnologia 3D ou estereoscópica foi criada em 1838 pelo físico e inventor britânico Sir Charles Wheatstone. Isso mesmo, há quase 200 anos atrás! Considera-se “The Power of Love” como o primeiro filme 3D exibido em 1922, que com o auxílio de um par de óculos com filtros coloridos (azul e vermelho) criava-se a ilusão de profundidade.

De lá para cá a tecnologia 3D sofreu várias modificações e melhorias, tendo seu pico de sucesso moderno com o lançamento do filme “Avatar” em 2010. Daí seguiu-se uma grande oferta no mercado de aparelhos de TV 3D, mas que neste ano de 2017 estão sendo descontinuadas por não ter conquistado em escala as empresas de conteúdo (como emissoras de TV e produtoras) e o público em geral.

O cenário tecnológico é realmente curioso. Além de evoluir em uma velocidade inacreditável, é comum que invenções “revolucionárias” acabem descartadas ou esquecidas depois de poucos anos de glória, ou sejam completamente remodeladas e relançadas com um conceito parcialmente diferente.

Por isso que temos visto na Saúde Digital várias propostas de tecnologias que em si não são “novas”, pois já são aplicadas em outros setores de modo muito eficiente. Porém como a área da saúde é uma das mais lentas na adoção de novas tecnologias, e também vemos várias que por fim se mostram frustrantes na mudança dos resultados clínicos dos pacientes, esse exercício de futurologia é ainda mais desafiador! Falar de tendências tecnológicas na saúde é até fácil, mas acertar o alvo “são outros quinhentos”, como se diz no ditado popular!

Temos que estar atentos às novidades, tendências e potenciais tecnologias disruptivas que irão transformar para melhor a vida e a saúde das pessoas, criando a nova e moderna Saúde Digital que desejamos. Mas isso não é aventura! Precisamos ter bom critério e equilíbrio na adoção das novas tecnologias, que são acompanhadas por mudanças de modelos de negócios, capacitação dos profissionais da saúde e revisão dos workflows de trabalho.  Criar o futuro dá muito trabalho!

Nada melhor que concluir este artigo com esta frase do Mestre Jedi, Yoda! Devemos perseguir o futuro com um pé firme no presente, com um olhar no amanhã e a lição do passado bem aprendida.

O futuro da Saúde Digital estará sempre em movimento, podemos ver certos contornos das tendências nas tecnologias digitais que despontam no horizonte e que nos levarão a este futuro, mas daí teremos que escolher quais caminhos desejaremos percorrer, com muita sabedoria.

Abraço a todos!

 Guilherme Rabello responde pela Gerencia Comercial e Inteligência de Mercado do InovaInCor – InCor / Fundação Zerbini (grabello.inovaincor@zerbini.org.br). Atua como consultor, palestrante e escreve artigos sobre inovação, tecnologia e negócios.