Quando Henry Ford lançou no começo do século 20 sua linha de produção de carros, que o levou a criar a potência automobilística que é a Ford Motor Company, ele teve que fazer uma escolha crucial no seu modelo de negócio: privilegiaria o produto ou o cliente? Bem, a resposta foi o produto! Ele tinha que massificar os carros a um preço baixo, e com isso não podia naquela ocasião personalizar o produto senão o tornaria caro demais para uma grande parcela da sociedade.
Esta decisão tomada por Henry Ford se traduziu na sua célebre frase: “O cliente pode ter o carro da cor que quiser, contanto que seja preto”.
Sim, o produto tinha prioridade, pois era mais lógico garantir o acesso das pessoas ao produto do que focar no estilo individual. Mas de lá para cá o mercado automobilístico passou por grandes mudanças e já conseguimos hoje personalizar nossos carros no ato da compra, até montando com o nosso gosto diversas características como cor e acessórios. Fazemos isso até pela internet, sem ter de ir a uma concessionária. Hoje podemos ter carros a preços acessíveis e personalizados!
Mas será que na Medicina isso será viável? Teremos como personalizar os tratamentos, as medicações e a assistência médica para cada paciente? Se sim, quais elementos irão capacitar esta mudança disruptiva na Saúde?
Bem, a personalização da terapia sempre foi uma prática até certo ponto, pois os doentes eram tratados individualizadamente pelos médicos ou curandeiros, dependendo de quanto voltemos no tempo. No entanto, neste século 21 a combinação de tecnologias para gerar e analisar dados derivados do paciente, a medicina genômica e a ciência da computação adicionaram a PRECISÃO para torná-la pessoal.
Quando notamos o avanço nas recentes tecnologias de Big Data, Inteligência Artificial, sequenciamento do genoma humano, sensores vestíveis e implantáveis para coleta contínua de dados do paciente, dentre tantas outras que estão surgindo, e a preços cada vez mais baixos, as condições para se convergir para a Medicina de Precisão Personalizada começa a despontar no horizonte.
Mais porque ela será uma nova realidade no contexto da Saúde Digital?
Bem, primeiro temos que entender como a medicina atual está chegando diante de limites e barreiras inerentes a tecnologia e metodologia até aqui empregadas. Veja, por exemplo, a questão do desenvolvimento de novas drogas. Hoje, para se criar um novo medicamento, são gastos centenas de milhões de dólares ou até ultrapasse a casa do bilhão de dólares! Além disso, os testes clínicos de validação são por amostragens populacionais que quase nunca refletem as grandes variedades genômicas da população mundial. Com isso, muitos dos modernos remédios, que são lançados com grande estardalhaço e marketing, além de preços altos (ou proibitivos para a maioria dos que necessitam deles), não necessariamente serão eficazes na maior parte dos pacientes.
Em dois artigos publicados, uma na revista Nature de 30 de abril de 2015 e outro no Wall Street Journal de 1 de maio do mesmo ano, o tema do gasto altíssimo de recursos econômicos na saúde contrastando com a pouca eficácia das novas drogas foi abordado. Tratava-se de novas drogas para doenças importantes e com baixa resposta nos pacientes! Tem-se aí a tal “Medicina Imprecisa”.
O médico cardiologista e renomado futurologista da Medicina, Dr. Eric Topol, disse o seguinte sobre este assunto: “A medicina da imprecisão está afligindo os cuidados de saúde”!
Sim, o custo de tratar as doenças que se manifestam em cada pessoa com aquele tiro de canhão está com seus dias contados pois a conta não fecha a muito tempo, pelo menos para a sociedade. A Medicina de Precisão na era da Saúde Digital vai chegar mais rápido do que prevemos. E isto acelerado pelo que alguns pesquisadores já expressam como “teste clínico individualizado”. Ou seja, você é a referencia para a confecção da terapia necessária.
Sequenciamento versus análise do genoma: Os custos para o sequenciamento do genoma estão caindo significativamente e o genoma de US$1,000 está praticamente uma realidade (você pode até obter isso gratuitamente em uma base de pesquisa colaborativa). Paralelamente, os custos da interpretação do genoma estão aumentando. Na verdade, no futuro próximo, o sequenciamento pode não ser o maior desafio – os esforços de interpretação, no entanto, serão responsáveis pela maioria dos esforços necessários e dos custos associados. É aí onde a computação em nuvem e melhores algoritmos de análise de dados irão fazer grande diferença.
Então, a nova Saúde Digital centrada no paciente, utilizando-se desses novo arsenal tecnológico de informação de dados do genoma aos coletados pelos wearables, com análise das ferramentas baseadas em Inteligência Artificial e podendo imprimir os medicamentos personalizados para a terapia dirigida, irá transformar a Saúde como hoje a conhecemos.
Veja estas duas experiências de impressão de medicamentos usando impressoras aditivas (3D), uma em Cingapura com pílulas customizadas e a outra da primeira empresa farmacêutica americana que recebeu aprovação do FDA para imprimir em 3D seu novo remédio para tratar epilepsia.
Este tema permite muitas outras análises e expansão da discussão para como as variadas tecnologias irão impulsionar as mudanças da saúde. Mas a onda desse tsunami já se formou, o que precisamos saber é quando ela chegará na nossa praia!
Guilherme Rabello responde pela Gerencia Comercial e Inteligência de Mercado do InovaInCor, núcleo de inovação do InCor / Fundação Zerbini (email: grabello.inovaincor@zerbini.org.br) Atua como consultor, palestrante e escreve artigos sobre inovação, tecnologia e negócios.